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Sem Rede

"Sobre aquilo de que não conseguimos falar, é melhor calarmo-nos." (Was sich überhaupt sagen lässt, lässt sich klar sagen; und wovon man nicht sprechen kann, darüber muss man schweigen) - Wittgenstein.

"Sobre aquilo de que não conseguimos falar, é melhor calarmo-nos." (Was sich überhaupt sagen lässt, lässt sich klar sagen; und wovon man nicht sprechen kann, darüber muss man schweigen) - Wittgenstein.

Sem Rede

19
Set11

Vendavais esfumados

Redes

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

No romance Um jantar a mais de Ismail Kadaré (Quetzal, 2002), a propósito de um escândalo sexual, aparece a seguinte notável comparação:

"E assim como um vendaval, que deixa a rodopiar atrás de si alguns destroços, também sobre esse assunto apenas algumas palavras equívocas pairavam ainda no ar, tornando-se cada vez mais raras" (p. 66)

Na história, ao fim e ao cabo, só há vendavais. Alguns deles, contudo, demoram muito tempo a esfumar-se. Quando isso acontece, aqueles que se acham no centro do furacão sofrem uma grande deceção. Descobrem que não se encontram em nenhuma charneira da história, apenas em algo que se esfuma sem justificar nem os sacrifícios nem os riscos consentidos. Apenas um balão que se vai esvaziando, ao ponto de, muito pouco tempo depois, quase ninguém se lembrar do acontecido, nem da perspetiva que justificava a ação, o denodo e a combatividade do tempo vivido.

19
Mai10

Conhecimentos e competências

Redes

Num dos ensaios de Perrenoud sobre as competências, inserido na antologia A escola e a aprendizagem da democracia (trad. Luís Cabral. 1a ed. Porto : Asa, 2002), há uma oposição entre uma escola de conhecimentos e uma escola de competências. Este meu pequeno texto visa discutir a efectividade desta oposição e questionar a sua relevância no objectivo confesso do autor que é o de lutar contra as desigualdades sociais. Sobre este tópico de política da educação de que a respectiva sociologia faz sua bandeira já dei a minha opinião em artigo recente aqui abaixo - A igualdade em educação.

Perrenoud critica a escola dos conhecimentos por ser própria para preparar para os estudos longos, isto é, para preparar os estudantes para a Universidade, mas não para os preparar para o emprego, para a vida. Enuncio aqui a minha primeira objecção ao que me parece ser uma contradição: se a escola preparar para uma saída rápida para o mercado de trabalho não estará a impedir à partida muitos de ambicionarem estudos de nível universitário? Pois não deixará nunca de haver escolas para preparar para a universidade, se a escola pública não o fizer! Simplesmente, esse caminho estará cada vez mais fora do programa da escola pública. Não estaremos assim a contribuir para o mal que o preocupa: que a sociedade não pretenda "uma igualdade de competências e de conhecimentos"?

Apesar de contraditório com os fins expressos, estou inteiramente de acordo com Perrenoud com a preocupação com o destino de milhares de jovens que não prosseguirão os seus estudos e que soçobram numa escola que não os prepara para a vida activa. Creio que a única resposta justa a esta questão é que a escola básica, gratuita e obrigatória, tem que preparar tanto para a vida activa como para o prosseguimento de estudos.

Será o currículo baseado em competências uma boa resposta a esta questão? De acordo com Perrenoud, as competências devem ser o crivo que permite seleccionar os conhecimentos. Estes importam apenas na medida em que são passíveis de ser mobilizados para a acção. É essa capacidade de mobilização, de investir conhecimentos, de fazer deles processos activos, que define as competências. Mas será possível ligar todos os conhecimentos relevantes a competências identificáveis? Será justo afastar do currículo todos os conhecimentos que não entrem visivelmente numa competência? Haverá algum conhecimento que não sirva para nenhuma competência?

É que se há uma relação difusa entre conhecimentos e competências, não seremos capazes de seleccionar e limitar os conhecimentos pelas competências. O resultado será um currículo tão generalizado como eram as tradicionais listas de conteúdos vigentes até há pouco tempo - e, por mim, tudo bem!

De acordo com Perrenoud, um currículo por competências desenvolve-se, não com as tradicionais sequências de aulas teóricas e exercícios de aplicação, mas com trabalho de projecto, oficina ou atelier onde a resolução de problemas conduza a conflitos cognitivos que, superados, conduzem o aluno a novos patamares de aprendizagem. É, enfim, o programa construtivista que tem aversão à memorização, ao treino sistemático, à simples recepção de exposições magistrais que se caracterizam pela quantidade de informação e pela lógica discursiva que as enformam.

O nosso Currículo Nacional foi elaborado com a preocupação definida por Perrenoud neste ensaio - definir as "competências essenciais". A primeira competência apresentada é a seguinte:

"Mobilizar saberes culturais, científicos e tecnológicos para compreender a realidade e para abordar situações e problemas do quotidiano".

Será que há conhecimentos que não se enquadrem nesta competência geral?

Observando uma disciplina plena de conhecimentos como História, encontramos no 3º ciclo a seguinte competência:

"Utiliza as noções de evolução, de multicausalidade, de multiplicidade temporal e de relatividade cultural no relacionamento da História de Portugal com a História europeia e mundial".

A bem dizer, parece o enunciado de um programa universitário, mas que condensa muito bem a maneira como a disciplina arregimenta o conhecimento dos factos históricos. Mas que diferença apresenta relativamente a um programa clássico de objectivos e conteúdos? A tarefa é relacionar a história de Portugal com a da Europa e a do Mundo em que se aplicam as ditas noções. Ora, para o fazer tem que saber os ditos factos.

Não sei se estão a compreender bem a minha dúvida: em que medida é que um programa de competências se distingue dum de objectivos e conteúdos. Se não se trata só duma disposição diferente a dizer as mesmas coisas...

Ora, se há disciplinas onde a aplicação da noção de competência é fácil, são aquelas que sempre foram disciplinas em que o saber-fazer tem uma dimensão predominante como a língua portuguesa onde, desde sempre, o saber ler, o recitar e o escrever estiveram no centro das preocupações da aula. Além disso, a linguística contemporânea foi a primeira a utilizar produtivamente a noção de competência.

O conhecimento histórico começa por ser uma narrativa, uma história que dá sentido ao nosso presente, e, mesmo, à nossa identidade, que literalmente muda com esse conhecimento. Sublinho: uma história que tem que ser sabida e que é operativa na medida em que enquadra e dá sentido a novas aquisições e assim se torna meta-narrativa, por ser um quadro de referências essencial. Não podemos prever com exactidão quando é que uma pessoa mobiliza esse conhecimento numa competência dita histórica - Quando lê o jornal? Quando vê um filme? -, pois, por vezes, acontece o contrário, é esse conhecimento que nos mobiliza, nos torna outros, nos leva a fazer perguntas a querer saber mais e a integrar mais narrativas, todas elas interagindo com a nossa essencial narrativa biográfica.

Dum modo genérico, o conhecimento todo, digo mesmo, a enciclopédia, e traduzo por uma outra palavra, a cultura, constitui um mapa do todo que é a vida. É ele mesmo uma competência.

Embora reconheça que há competências identificáveis com níveis de desempenho mensuráveis e que se afiguram importantes para a realização futura dos nossos alunos - cálculo, língua estrangeira, produção de objectos com diversos materiais para responder a determinadas finalidades, leitura, escrita, etc. - e que têm que ter prioridade no seu currículo, nem todo o conhecimento é redutível a um programa de competências sem que haja uma grande perda para a cultura e é isso que Perrenoud propõe - pôr de lado tudo o que não se integra numa competência, pôr de lado o que apenas parece "interessante".

 

Imagem retirada de http://www.gestiopolis.com/canales5/fin/reflex6.jpg

10
Jun05

A glória dos descobrimentos

Redes

A epopeia das viagens de descoberta dos séculs XV e XVI continua incólume no imaginário nacional, apesar de todos os ataques que sofreu com a história económica dos Annales e da historiografia marxista. Muitos cidadãos imaginam que, nesses séculos, Portugal era o centro da Europa, que o mundo lhe deve a unidade actual e que os povos africanos, asiáticos, americanos e oceânicos receberam das suas mãos o critianismo e a civlização.
É inquestionável que Portugal, nos reinados de D. Duarte, D. João II e D. Manuel I liderou, juntamente com a Espanha, os chamados "Descobrimentos". Mas, a análise histórica revela que estes empreendimentos eram de facto internacionais, tanto ao nível do conhecimento científico, como do financiamento das viagens e da relação com os mercados a que se destinavam as especiarias.
Num domínio essencial, por exemplo, o da cartografia, pontificavam os cartógrafos italianos e alemães. No que diz respeito ao financiamento, as praças alemãs e flamengas lideravam, de tal maneira, que muitas vezes os produtos que vinham nas naus já estavam comprados e destinavam-se a essas praças. Lisboa era assim um entreposto subordinado a outras praças mais importantes como Veneza (que depressa se refez do impacto dos primeiros carregamentos de especiarias que chegaram pelo Atlântico) e Antuérpia.
Quanto ao aspecto civilizador, continuam a ser ignoradas as verdadeiras intenções dos navegadores portugueses. O tráfico de escravos que acompanhou desde o seu início a realização das viagens, por exemplo, raramente é mencionado.
Custaria muito apresentar, às crianças, o Infante D. Henrique - Henry the Navigator, como dizem os ingleses - como um traficante de escravos. O Infante autorizava os navegadores algarvios a irem à costa africana raptarem pessoas e beneficiava de um quinto de cada carregamento. Zurara mostra-nos um Infante insensível ao drama humano, em Lagos, à espera da sua parte (cerca de 40 escravos dum dos primeiros carregamentos), enquanto a população se revoltava contra a separação entre mães e filhos. Portugal teve esta glória histórica: a de ter sido o iniciador do tráfico de escravos africanos e a última das potências europeias a acabarem com essa prática.

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