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"Sobre aquilo de que não conseguimos falar, é melhor calarmo-nos." (Was sich überhaupt sagen lässt, lässt sich klar sagen; und wovon man nicht sprechen kann, darüber muss man schweigen) - Wittgenstein.

"Sobre aquilo de que não conseguimos falar, é melhor calarmo-nos." (Was sich überhaupt sagen lässt, lässt sich klar sagen; und wovon man nicht sprechen kann, darüber muss man schweigen) - Wittgenstein.

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29
Out08

Rankings e chumbos - o seu a seu dono

Redes

(Antes deste, leia por favor o artigo anterior, Chumbos no Le Monde Diplomatique já aqui abaixo. Obrigado)

 

Estamos perante a edição de 2008 dos rankings. Na televisão, entrevistam-se as doutas opiniões dos dirigentes de escolas vencedoras e de escolas derrotadas. À baila, vem também a proposta do CNE de acabar com os chumbos. E nas clarividentes respostas o fim dos chumbos é conotado com facilitismo. Mas não vi ninguém mostrar em que é que o chumbo contribui para a excelência na educação.

O director do S. João de Brito crê na eficácia pedagógica do seu colégio, mas ignora a selecção social operada pelas suas propinas. É a isto que chamam ciência pedagógica? Privatizem a educação e que julgam que terão? O brilho do S. João de Brito espalhado pelo país? Eu adivinho: os alunos pagos pelo estado não terão melhor rendimento médio do que aquele que tem actualmente a generalidade das escolas públicas. Os colégios como o S. João de Brito, onde as propinas ultrapassam a capitação estatal, serão os campeões do ranking. Quem paga mais terá melhor educação pela simples exclusão dos que não podem pagar, que têm, em geral, muitos problemas. As propinas não são apenas o custo do ensino são também uma forma de reservar o direito de admissão.

Isso é o que esconde o director do S. João de Brito e o que mostra a directora da Escola Infanta D. Maria de Coimbra quando se queixa da sua desvantagem competitiva: não poder escolher os alunos. É o que exibe despudoradamente a Escola EB2,3/S do Cerco do Porto, a grande derrotada - o que fazer destes alunos?

Os rankings são um triste espectáculo porque não mostram nunca os verdadeiros vencedores: o rendimento das famílias dos alunos, as habilitações académicas dos pais, o custo unitário por aluno e, em último lugar, os professores e a gestão da escola. As outras variáveis têm um peso tão avassalador que nunca saberemos o verdadeiro peso da qualidade do corpo docente.

A escola passa a ser uma marca de excelência que o ranking não faz senão reforçar. Os mais abastados escolherão os colégios de topo para os seus filhos e esta afluência resultará inevitavelmente na reedição do sucesso. As propinas terão assim margem para subir.

Disto não falam os responsáveis. Querem garantir que o sucesso é seu. Preferem ignorar o verdadeiro carácter de classe da sua selecção escolar. Por isso, ao se compararem com a escola pública dizem disparates como o que ouvimos do director do S. João de Brito: "não há dono na escola pública".

Comparem-se então com colégios que têm donos. Ainda nesse caso, não se esqueçam de cotejar a comparação com os montantes pagos pelos alunos: talvez se verifique a regra universal do mercado: quem pagar mais terá melhor escola.

Mas estes senhores comentam também a ideia de acabar com os chumbos e, falam, pasme-se, em "auto-estima". O fim dos chumbos poderia diminuir a auto-estima dos alunos. Ora, o problema do chumbo é que ele destrói a auto-estima dos alunos mais fracos. A ideia de que um aluno está na escola para passar de ano é uma perspectiva verdadeiramente medíocre pelos seguintes motivos:

- o sistema de ensino aceita mil e uma excepções à regra e, por isso, milhares de alunos passam de ano com notas falsificadas1, isto é, votadas em conselho de turma.

- um aluno pode percorrer todo o ensino básico sem aprender nada de relevante nem de Matemática nem de Inglês pelos critérios vigentes de transição de ano (para citar uma combinação que me parece comum).

Se os desempenhos escolares fossem medidos por padrões assentes nos próprios programas das disciplinas, os alunos trabalhariam para esses níveis de desempenho em Matemática, em Ciências, em História, em Língua Materna ou em Língua Estrangeira. Certificar-se-iam competências e conhecimentos efectivos e não anos de escolaridade. Dizer que alguém hoje tem o 9º ano não significa absolutamente nada, pois pode tê-lo concluído num curso de CEF2 ou pode ter tido notas falsificadas3.

Nuno Crato fala em exigência. Acabar com os chumbos seria diminuir a exigência. Ora no post anterior mostrei como no PISA há alunos noruegueses no 10º ano com o mesmo desempenho de alunos portugueses no 7º. A única diferença é que estes chumbaram 2 ou 3 vezes e aqueles, nunca.

Trata-se de reorganizar o sistema de progressão e de avaliação. Actualmente, temos chumbos e facilitismo. Já mostrei isso. Damos de graça a passagem de ano a alunos que sabemos que já não vão beneficiar nada com a repetição do ano, alterando as classificações artificialmente. Em breve, teremos professores preocupados com o seu próprio desempenho que terão mil e um argumentos válidos para não dar negativas e os chumbos vão desaparecer por inibição.

O problema será sempre o mesmo: o que fazer com as pessoas que estão na escola sem progredir realmente na aprendizagem?

1Notas dadas sem critérios pedagógicos intrínsecos ao programa da disciplina que ou são votadas em conselho de turma ou são concedidas a título gracioso pelo próprio professor. É isto que é o facilitismo a que estamos condenados na escolaridade obrigatória, e não só.

2Cursos que conseguem a façanha espantosa de pôr alunos, que têm problemas de progressão no ensino básico, a concluir o 9º ano em apenas dois anos. Não vejo nenhum problema nisto desde que se especifique do que se trata: um curso profissional. O que me choca é o constante desvirtuamento dos rótulos. Que significa neste contexto "ter o 9º ano"?

3Ver acima.

 

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