Ler, escever, contar, descobrir e experimentar(Educação)
Joaquim Sá, militante do ensino das
ciências a crianças do 1º ciclo, veio agora dar
contas do projecto Ciência Viva, de que fez parte, na obra
Crianças aprendem a pensar ciências, lançado
recentemente pela Porto Editora, em co-autoria com Paulo Varela. Em
entrevista ao Educare, (Artigo
na revista Educare), chamou a atenção para alguns
dos problemas da formação de professores e do
magistério do 1º ciclo. Critica o peso excessivo de
lobbys académicos no currículo da formação
de professores que diminuem o peso das componentes que
verdadeiramente interessam ao exercício pedagógico na
sala de aula.
Também me parece que, nesses cursos, abundam
cadeiras de sociologia, antropologia e de metodologia de investigação
em ciências sociais, como se os professores se preparassem para
fazer investigação sociológica. Também há
componentes da área das ciências da educação
como desenvolvimento curricular, didácticas gerais e
específicas (ou metodologias, como se prefere dizer,
actualmente), com um peso exagerado e com sobreposições
óbvias que levam os estudantes a ficarem frequentemente com a
impressão de que estão a tratar da mesma coisa, ao
passarem duma cadeira para outra.
Reconheço que nessas áreas das ciências
ditas sociais e da educação, há algumas coisas
válidas para a formação do professor, mas
concordo com Joaquim Sá, quando diz que o peso de programas de
áreas teóricas alheias ao dia a dia do futuro professor
resulta mais de lobbys académicos do que da
necessidade efectiva desses conteúdos.
Os programas estão espartilhados de acordo com
as especialidades dos formadores e não com as necessidades dos
futuros docentes. Daí a sobreposição de
conteúdos. Se pensássemos em termos do futuro docente,
as cadeiras teriam outras designações e poderiam
aglutinar conteúdos de especialidades académicas
diferentes.
É provável que um professor que dá
uma cadeira como Educação Matemática se refira à
taxinomia de objectivos educacionais de Bloom, mas esse mesmo
conteúdo será tratado em Ensino-Aprendizagem da Língua
Portuguesa e em Desenvolvimento Curricular. Num programa, vejo
História e Filosofia da Educação e pergunto
porque é que esta cadeira não aglutina também
Sociologia da Educação. Adivinho a resposta: porque
nessa escola não há departamentos autónomos de
Filosofia e de História, mas há com certeza um de
ciências da educação e, provavelmente, um
professor terá feito uma tese na área da história
da educação e achou importante a perspectiva filosófica
(ou o inverso).
Como se não bastasse o currículo ser
desfigurado pelos interesses departamentais das escolas de formação
de professores, ainda há o esforço de cativar os alunos
para esses cursos:
"Muitas instituições
têm como forma de recrutamento as facilidades concedidas na
atribuição de diplomas e de classificações
elevadas. Se no final dos cursos de formação de
professores do 1.º ciclo aplicássemos um exame com
questões simples como conversão de quilogramas em
decigramas e outros conteúdos que deverão ensinar aos
alunos, uma grande percentagem desses recém-licenciados
chumbava."
Acho melhor não fazermos a experiência.
Por vezes, o confronto com a realidade é demasiado duro. Se os
conhecimentos básicos dos recém-formados professores
são assim tão baixos, temos que considerar
verdadeiramente ridículo o peso das áreas que referi
acima.
A formação científica das nossas
crianças não deve ficar amarrada a preconceitos de
ordem curricular. Deve ser tão aberta quanto possível e
ser acessível e motivante. Por isso, Joaquim Sá dá
ênfase à necessidade de a escola ter recursos para levar
os mais novos a descobrirem o valor da ciência experimental.
As diversas competências devem ser
desenvolvidas articuladamente. A formação científica
não tem que esperar pela leitura e pela escrita. Muito pelo
contrário, a escrita, a leitura e o cálculo, ganham uma
motivação intrínseca quando têm como
conteúdo o trabalho de observação e de
experimentação. A mesma perspectiva á válida
para outros conteúdos como a história e a literatura
infanto-juvenil.
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