O AZ do Ministério da Educação e Santana Castilho
Hoje no Público, de 18 de Março, Santana Castilho critica o folheto AZ do Ministério da Educação (A a Z da Educação. 2005-20091). O Z deve querer dizer mesmo que acabaram e que nada mais têm a fazer.
Vem a propósito comentar o comentário de Santana Castilho por as suas afirmações coincidirem com muito do que aqui tenho escrito.
À elogiada redução das “desigualdades no acesso à formação e ao conhecimento“, responde Santana Castilho:
“Era bom, mas não foi. Quando diminuiu a exigência do ensino ministrado na escola pública para níveis indigentes, mais não fez que acentuar as desigualdades. Os que só contam com a escola pública como fonte de saber estão hoje mais frágeis e empobrecidos. Os outros pagam no privado o que o Estado diz que dá mas não dá”
No post anterior, disse isso mesmo: a generalização facilitista de certificações escolares é um presente envenenado. Creio que os que acreditam na escola procuram algo que os diferencie, algo que custa a adquirir e não a indiferenciação que ignora os conhecimentos e as habilidades conquistadas.
Se aqui defendi o fim dos “chumbos”, não é por ser facilitista, mas por verificar os fracos resultados que a repetição de ano tem como estratégia pedagógica. Os países escandinavos reduziram a repetição de ano para níveis insignificantes. E se o PISA revela que esses países têm alunos do 10º ano com desempenhos que não ultrapassam o que se espera dum aluno do 7º ano, a verdade é que o nível global é muito superior. Creio que, num sistema assim, o que diferencia os alunos não é o ano em que estão, pois todos chegam a todos os anos, mas sim os desempenhos efectivos na avaliação do dia a dia.
Na Finlândia, por exemplo, parece-me que as expectativas das famílias vão para a possibilidade maior ou menor dos jovens entrarem para a universidade ou de acederem a cursos profissionais, de acordo com as capacidades efectivamente demonstradas.
A falta de clareza no significado, a confusão de critérios e a manipulação das desculpas, que vão da ordem do NEE, aos problemas socio-afectivos, ao risco de delinquência e aos dramas familiares, conduzem a pautas de notas, equalizadas, alinhadas, em que o caos que lhes dá origem é esquecido.
A luta contra o abandono escolar é uma das preocupações que faz já hoje subir os níveis “3”, cuja percentagem aumentará estrondosamente com a avaliação do desempenho docente. Creio que, em breve, atingiremos a fasquia de menos de 2% de repetições de ano da Finlândia, mas duvido que os testes PISA evidenciem essa fulgurante ascensão.
Será que quando atingirmos 98% de sucesso escolar, o dito abandono acabará na mesma proporção? Como os jovens com menos de 16 anos terão cada vez menos lugar no mercado de trabalho, e o lugar onde brincam, arranjam amigos e namorado(a)s é a escola, é provável que sim.
A questão é se os resultados avaliados em testes de leitura, matemática e ciências terão um melhoramento comparável.
Actualmente, um grupo considerável de alunos encontra-se ainda sujeito ao seguinte esquema que já aqui denunciei:
CHUMBO - REPETIÇÃO DE ANO - FACILITISMO
São demasiados os alunos que, na repetição de ano, continuam a não ter um aproveitamento positivo. Nessa altura, as suas notas são sujeitas a votação e eles passam por facilitismo.
Há muitos alunos cujos professores já concluíram que vêm para a escola, apenas porque têm que vir e o que interessa não é ensinar-lhes o que quer que seja, mas sim proporcionar-lhes uma estadia agradável que não lhes altere demasiado a estrutura neuronal, sobretudo o hemisfério esquerdo.
Optar pelo global, pelo sincretismo, pela espontaneidade, em que tudo se liga a tudo, é a via a adoptar, pois o que interessa é ser e estar. Mais do que o saber, deve a escola proporcionar o aprender a ser - na célebre expressão de Edgar Faure -, em que o ser é cada vez mais um misto de preceitos éticos que dá pelo nome de valores que se confunde muito frequentemente com a moral cristã e cada vez menos com a bagagem cultural e científica, com que as disciplinas clássicas integram o jovem na complexidade do mundo em que vive e lhe aumentam o poder sobre a realidade, completam a formação cerebral com poderosos instrumentos intelectuais, como a leitura, a escrita, o desenho, as técnicas, as artes, o cálculo, a geometria, a álgebra e o conhecimento científico, histórico e geográfico que lhe representam o mundo numa cada vez mais ampla multiplicidade de dimensões (sem pretender ser exaustivo).
As taxas de abandono ainda são elevadas e por isso Santana Castilho critica a extensão da escolaridade obrigatória:
“Se não conseguimos cumprir a escolaridade obrigatória de nove anos, para que serve subir a fasquia senão para aumentar o desastre?”
Evidentemente, o objectivo é manter as crianças o máximo tempo possível na escola, pois a política educativa está nas mãos de sociólogos, preocupados com a socialização e não com a formação humanística e científica:
“Transformar a escola numa enorme caserna, onde se guardam criminosamente crianças durante 12 horas em cada dia é objectivo de vesgos, mas não é objectivo de quem saiba o que é uma criança e o que deveria ser uma família. O que este Governo fez foi promover um conceito estalinista de educação, encarando os pais como meros operários a quem se retira o convívio e a responsabilidade pelos seres que geram. Alimentar uma solução em que os pais não têm tempo para estar com os filhos não põe coisa alguma ao serviço dos alunos e das suas famílias“.