Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Sem Rede

"Sobre aquilo de que não conseguimos falar, é melhor calarmo-nos." (Was sich überhaupt sagen lässt, lässt sich klar sagen; und wovon man nicht sprechen kann, darüber muss man schweigen) - Wittgenstein.

"Sobre aquilo de que não conseguimos falar, é melhor calarmo-nos." (Was sich überhaupt sagen lässt, lässt sich klar sagen; und wovon man nicht sprechen kann, darüber muss man schweigen) - Wittgenstein.

Sem Rede

05
Fev07

TLEBS: Corrigir e voltar atrás?

Redes
Vem esta questão a propósito da TLEBS, que se diz que vai ser suspensa no próximo ano.
Acontece que, pela leitura da TLEBS, e pela polémica que ela suscitou, encontrei erros no meu ensino da gramática. Confirmei também que algumas das minhas concepções divergentes em relação a vários colegas meus, eram justas.
Vou dar exemplos de apenas três erros (há mais!) que eu não quero fazer.

Sujeito

Diz a gramática do Nunes Figueiredo e Gomes Ferreira (1) que o sujeito é o "o ser ou coisa sobre que se faz uma afirmação". É uma simplificação semântica que se pode eventualmente aceitar como conveniente, em termos didácticos, sobretudo, se depois ensinarmos correctamente como se determina o sujeito. No item seguinte, considera que podem desempenhar a função de sujeito, um substantivo, um pronome, um numeral, ou mesmo, uma frase.
Determinemos então o sujeito nas próprias frases fornecidas pelo autor da primeira gramática que estudei em profundidade (4º ano dos liceus):
1. O cão é um animal doméstico.
O sujeito é "cão".
Se substituirmos o dito substantivo por um pronome a frase fica:
2. Ele é um animal doméstico.
O sujeito passa a ser "ele". Mas repare-se que "ele" substitui o grupo nominal e não apenas o nome.
Vejamos uma frase com atributos e complementos determinativos:
3. O cão do meu amigo parece um animal selvagem.
Neste caso, o sujeito seria igualmente "cão", pois "do meu amigo" seria complemento determinativo. O predicativo do sujeito seria "animal", pois "selvagem"  seria um atributo. Quer dizer, não se considera o sujeito como um grupo de palavras à excepção do caso de uma "oração substantiva".
Esta maneira de considerar a sintaxe da frase, como uma linha sequencial em que os elementos se aglomeram sem qualquer hierarquia que não seja a distinção entre elementos fundamentais e elementos complementares da oração é a que resulta da Nomenclatura de 67 (2) que nunca cumpri no meu ensino.
A maior parte dos professores, suponho, ensina que
- em 1. o sujeito é "O cão";
- em 3.  o sujeito é "O cão do meu amigo".
Esta análise estaria de acordo com a Nova Gramática do Português Contemporâneo de Lindley Cintra e Celso Cunha (3) que está informada com as aquisições da gramática generativa, no que respeita à hierarquia dos elementos da frase, e não é "tradicional" no mau sentido do termo.
Não faz qualquer sentido a utilização da expressão gramática tradicional a não ser para a diferenciar da gramática generativa que se refere à competência linguística do falante. Há uma gramática que se adquire e outra que se ensina e que se estuda e que é uma continuação, um desenvolvimento da primeira e está ligada a usos linguísticos que eu creio mais sofisticados, ligados ao exercício da escrita e da leitura, como preparação para funções sociais cada vez mais exigentes. Ora, a gramática escolar que é uma coisa que se ensina e que é analítica e normativa, nunca foi alheia às aquisições do conhecimento linguístico. Chamar-lhe tradicional pode conotá-la com atraso. A necessidade sentida de criar a Nomenclatura de 1967 e de fazer a TLEBS prova que estamos perante uma realidade dinâmica, em constante evolução.

Predicado

Ainda de acordo com Nunes Figueiredo e com a Nomenclatura de 67, o predicado ou é o verbo ou é o verbo e a qualidade que se lhe acrescenta no caso dos verbos de significação indefinida. Os complementos directo e indirecto, assim como os complementos circunstanciais, são "elementos complementares da oração", não fundamentais, que se acrescentam ao verbo.
Assim:
- em 1., o predicado seria "é animal";
- em 3., "parece animal" (pois todos os outros elementos são complementares).
Vejamos como seria em frases com os complementos acima referidos:
4.  Ele foi para Lisboa.
5. A polícia judiciária do Porto interrogou o presidente do FCP.
6. O escritor dedicou o livro à sua mãe.
Teríamos:
- em 4. "foi" como predicado e "para Lisboa" como complemento circunstancial de lugar;
- em 5., "interrogou" como predicado e "o presidente do FCP" como complemento directo;
- em 6., "dedicou" como predicado e "o livro" e "à sua mãe", como complementos directo e indirecto, respectivamente.
A maior parte de nós ensina que o predicado é:
- em 4., "foi para Lisboa";
- em 5. "interrogou o presidente do FCP";
- em 6., "dedicou o livro à sua mãe".
Note-se que há uma contradição na gramática de Nunes Figueiredo quando reduz o sujeito ao substantivo e, mais à frente, na "transformação passiva" considera como sujeito o grupo nominal inteiro. Creio que foi forçado a isso pela própria lógica da passiva (4). É de acrescentar que esta redução do sujeito ao nome e do predicado ao verbo contradiz a própria definição semântica que dá das duas funções (5).
Conheço colegas que ensinam as duas funções tal e qual como Nunes Figueiredo, com o argumento de que "a gramática generativa acabou".
Para a TLEBS, fazem parte do predicado, os complementos e os modificadores do verbo e do grupo verbal. Antes de ter lido a TLEBS, predicado e grupo verbal eram a mesma coisa para mim, embora sob uma perspectiva diferente. Resumindo: só incluía no predicado os elementos obrigatórios, exigidos pelo verbo.
Alteremos 5. para exemplificar:
7. Ontem, a polícia judiciária do Porto interrogou o presidente do FCP.
Neste caso, eu não incluiria "ontem" no predicado. Com efeito, "ontem"  modifica o grupo verbal, mas não faz parte dele, pois não é exigido por "interrogou" que apenas exige um complemento directo. Depois de analisar a árvore da frase, cheguei à conclusão que a TLEBS estava certa. Em termos didácticos, também é mais simples dizer que é tudo o predicado. Além do mais a TLEBS coincide com Cintra e Cunha (6)

Subordinante e subordinadas

Outra mudança que eu acho que se impõe foi colocada pelo João Peres como uma crítica à TLEBS. Eu considero-a inteiramente justificada. Tudo se resume ao seguinte: as orações que desempenham funções sintácticas fundamentais da subordinante, integram-na.
Vejamos:
8. O Público diz que ontem a polícia judiciária do Porto interrogou o presidente do FCP.
Neste caso, não podemos considerar "O público diz" como subordinante porque esta expressão não é uma frase, pois falta-lhe o complemento directo que é "que ontem a polícia judiciária do Porto interrogou o presidente do FCP".
Penso que, em geral, a lógica está do lado da didáctica. Quanto mais lógico, mais simples. Se distingo frase (ou oração, se quiserem) de não-frase, não vou depois infringir a regra dizendo que uma expressão sem sujeito ou sem complemento directo é uma "oração" ou frase "subordinante". Duma forma geral, a falta de lógica apela ao decorar daquilo que o professor enuncia.
Agora pergunto: que autoridade tem o direito de me obrigar a ensinar coisas erradas que nem didacticamente se justificam? Mais: quem pode exigir aos professores formados pela TLEBS, que voltem a ensinar erradamente?

NOTAS

(1) Nunes Figueiredo, J. M., e Gomes Ferreira, A., Compêndio de Gramática Portuguesa, Porto, Porto Editora, 1975, p. 53.
(2) Nomenclatura Gramatical Portuguesa, Portaria nº 22664, Diário da República, I Série, 28 de Abril de 1967.
(3) Cintra, Lindley e Cunha, Celso, Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, Sá da Costa,1992,  p. 122.
(4) Nunes Figueiredo, J. M., e Gomes Ferreira, A., p. 62
(5) Idem, p. 55.
(6) Veja (3)
Para a análise do João Peres referida acima, por favor, veja  http://jperes.no.sapo.pt/
02
Jan07

Predicativo do sujeito

Redes
Eu não estava a ser exacto quando, em resposta à colega Inês Pinto, nos comentários a Carta ao Sr. José Nunes, promotor de uma petição para revogação da TLEBS, afirmei o seguinte:
"À partida, não concordo com o dicionário da Terminologia Linguística, quando admite um sintagma preposicional como predicativo do sujeito. Para mim, tem de ser um Sintagma Nominal ou um Sintagma Adjectival."
Descobri isso ao encontrar na gramática do Lindley Cintra e Celso Cunha um exemplo de predicativo do sujeito do seguinte género:
(1) O homem estava entre a vida e a morte.
A parte da frase assinalada a itálico seria para mim um predicativo do sujeito aceitável.
As minhas objecções eram na verdade de ordem semântica e não sintáctica.
Também, perante uma frase como a seguinte,
(2) O carro é do meu pai,
eu não teria dificuldade em aceitar o grupo assinalado com predicativo do sujeito, porque reconheceria aí a transformação do grupo nominal "o carro do meu pai" numa frase em que o verbo copulativo se limita a fazer uma ligação.
Concluí, então, que tinha caído no mesmo tipo de armadilhas que denuncio ao criticar os colegas que dizem aos alunos que o sujeito é "aquele que realiza a acção". Se, em vez de (1), a frase fosse
(3) O homem estava entre o Rossio e os Restauradores,
eu diria erradamente que estava perante um verbo locativo e um complemento preposicional, mas a frase tem exactamente a mesma estrutura da anterior.
A minha dificuldade compreende-se por quase não aparecerem nas gramáticas casos de grupos preposicionais como predicativo do sujeito e, ainda menos, com o significado de lugar, como era o caso em apreço. Mesmo no meu exemplar da Gramática... da Maria Helena Mira Mateus, os exemplos de predicativo do sujeito são grupos nominais ou grupos adjectivais.
Mas agora parece-me aceitável que qualquer complemento preposicional que se ligue ao sujeito através de um verbo copulativo, seja um predicativo do sujeito. O que está em causa é o tipo de ligação que o verbo realiza. Com efeito, se iniciarmos uma frase da seguinte maneira
(4) Camões esteve...,
as perguntas possíveis são as mais diversas - ONDE? COMO? O QUÊ? - e o tipo de grupos que lhes podem responder são também dos mais variados - grupos nominais, adjectivais, adverbiais e preposicionais, revelando, portanto, a significação indefinida do verbo.
Se o início da frase fosse
(5) Camões morou...,
a pergunta suscitada seria apenas ONDE? e a resposta um complemento preposicional de lugar.
 Portanto, em "Camões esteve em Macau", "em Macau" é predicativo do sujeito.

Mais sobre mim

foto do autor

Sigam-me

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Wikipédia

Support Wikipedia

Arquivo

  1. 2023
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2022
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2021
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2020
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2019
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2018
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2017
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2016
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2015
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2014
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2013
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D
  144. 2012
  145. J
  146. F
  147. M
  148. A
  149. M
  150. J
  151. J
  152. A
  153. S
  154. O
  155. N
  156. D
  157. 2011
  158. J
  159. F
  160. M
  161. A
  162. M
  163. J
  164. J
  165. A
  166. S
  167. O
  168. N
  169. D
  170. 2010
  171. J
  172. F
  173. M
  174. A
  175. M
  176. J
  177. J
  178. A
  179. S
  180. O
  181. N
  182. D
  183. 2009
  184. J
  185. F
  186. M
  187. A
  188. M
  189. J
  190. J
  191. A
  192. S
  193. O
  194. N
  195. D
  196. 2008
  197. J
  198. F
  199. M
  200. A
  201. M
  202. J
  203. J
  204. A
  205. S
  206. O
  207. N
  208. D
  209. 2007
  210. J
  211. F
  212. M
  213. A
  214. M
  215. J
  216. J
  217. A
  218. S
  219. O
  220. N
  221. D
  222. 2006
  223. J
  224. F
  225. M
  226. A
  227. M
  228. J
  229. J
  230. A
  231. S
  232. O
  233. N
  234. D
  235. 2005
  236. J
  237. F
  238. M
  239. A
  240. M
  241. J
  242. J
  243. A
  244. S
  245. O
  246. N
  247. D
  248. 2004
  249. J
  250. F
  251. M
  252. A
  253. M
  254. J
  255. J
  256. A
  257. S
  258. O
  259. N
  260. D